Aristóteles nasceu
em Estagira (Macedônia) em 384 a.C. e morreu em Cálcis, na Ilha de Eubea, em
324 a.C. Durante 20 anos, entre 367 e 347 a.C. foi discípulo de Platão (427-347
a.C.), na Academia.
Por volta de 342
a.C. foi-lhe confiada a educação de Alexandre (356-323 a.C.), filho de Filipe
II (382-336 a.C.), rei da Macedônia, missão que o nosso pensador cumpriu até
335 a.C. Nesse ano Aristóteles fundou, em Atenas, no Liceu, a sua própria escola,
chamada de peripatética e nela
desenvolveu a docência da filosofia e das ciências até 323 a.C., quando se
retirou à ilha de Eubea (terra da sua
mãe), no Mar Egeu.
Os escritos do
filósofo que conhecemos, na sua maior parte estão constituídos pelas notas de
aula tomadas pelos seus discípulos, nos cursos que ofereceu no Liceu. Esses
escritos eram chamados, pelo próprio Aristóteles, de esotéricos. Diferentemente de Platão, que escreveu a sua obra no
elegante dialeto ático, Aristóteles utilizou a língua comum, a koiné (ou grego vulgar), que se estendeu
como língua franca ao longo da bacia do Mediterrâneo, e que deu ensejo à grande
globalização cultural do Império de Alexandre.
Em 7 itens podemos
sintetizar o essencial do pensamento de Aristóteles:
1 - Com Aristóteles encontramos um sistema filosófico
completo. A sua obra pode ser agrupada em cinco grandes
blocos, assim:
I – Lógica, que abrange seis obras,
genericamente denominadas de Organon:
Categorias, Da Interpretação, Primeiros
Analíticos, Segundos Analíticos, Tópicos e Refutação dos Sofistas.
II – Escritos Científicos, integrados por
quatro obras: Física, Sobre a Alma,
Partes dos Animais e Astronomia.
III – Metafísica, que inclui os quatro livros
que levam esse título.
IV – Ética, com as seguintes obras: Ética a Nicômaco, Ética a Eudemo, Grande
Ética, Política e Constituição de Atenas.
V – Poética, que abrange dois escritos: Retórica (8 livros) e Poética.
2 – No conjunto de obras que integram o Organon, notadamente nos Analíticos e nos Tópicos, Aristóteles formula a sua Lógica Formal, que estuda os esquemas de raciocínios válidos, independentemente do
conteúdo dos mesmos. A Lógica Aristotélica foi aperfeiçoada, posteriormente,
por Boécio[1]
(480-524) e por Pedro Hispano[2]
(1205-1277). A Lógica Formal de Aristóteles foi recebida, na tradição medieval,
como parte da Filosofia e se denominava “logica
minor”, sendo que a “logica maior”
correspondia à Teoria do Conhecimento.
A Lógica Formal
somente se começou a distanciar da Filosofia no século XVII, quando Gottfried
Wilhelm Leibniz (1646-1716) formulou a sua Ars Combinatoria, que deitou os
alicerces da Lógica Matemática, a partir do princípio de que seria possível
substituir os conceitos, nos raciocínios, por símbolos matemáticos. Com essa
base, Leibniz pretendia evitar as disputas sobre conceitos com significação
equívoca, atribuindo, a cada um deles, uma significação exata, expressa em
símbolos matemáticos.
As hipóteses de
Leibniz foram aperfeiçoadas, do ângulo matemático, por George Boole (1815-1864),
na obra intitulada: Uma interpretação das leis do pensamento em que se fundamentam as
teorias matemáticas da Lógica e das Probabilidades (1857). Esta obra
deu ensejo à denominada álgebra booleana,
ou conjunto de técnicas algébricas
para lidar com expressões no cálculo proposicional. Com base nesse
fundamento, a Lógica Matemática foi sistematizada, no século XX, por Bertrand
Russell (1872-1970) e Alfred North Whitehead (1861-1947), na obra: Principia
Mathematica (1913). Mais adiante, na metade do século XX, foi formulada
a Lógica dos Circuitos pelo engenheiro norte-americano Claude Shannon
(1916-2001), com a obra intitulada: A mathematical Theory of Communication
(1948), na qual os símbolos matemáticos são substituídos pela Lógica Binária
(passível de ser traduzida em impulsos eletrônicos). Essa é a base da linguagem
e da memória artificial utilizadas nos hodiernos computadores.
Como se pode
observar, longa foi a caminhada da Lógica Formal até as manifestações
contemporâneas dessa especialidade que, sem Aristóteles, certamente não teria
chegado até os magníficos resultados que apresenta, hoje, como disciplina
autônoma no terreno das ciências.
3 - Na Teoria do Conhecimento, Aristóteles partiu para
elaborar um ponto de vista transcendente ou realista, como tinha feito o seu
mestre Platão. No entanto, o cerne da gnosiologia aristotélica não
é constituído, como em Platão, pela hipótese de Idéias subsistentes e
independentes do mundo. Para Aristóteles, o fundamental é o conhecimento da
realidade que nos circunda, e é aí que ele coloca a sua noção da substância
primeira (próte ousía), que é
definida como aquilo que é em si e não em
outro. As substâncias externas, objeto da nossa experiência sensível, são
as substâncias primeiras. Elas são
formadas por matéria (hyle) e forma (morfé). A forma das realidades substanciais conhecidas pelos sentidos
movimenta a razão humana, que se encontrava em potência (intellectus patiens, segundo a terminologia escolástica). Ativada
pela forma substancial, a razão fica
em estado de ato (intellectus agens)
e se torna capaz de agir, elaborando representações das formas substanciais
intuídas na experiência. A partir da intuição, pela razão, da essência da
substância concreta (ou seja, da sua forma),
é elaborada uma representação abstrata da mesma, que Aristóteles denomina de substância segunda (deutere ousía) denominada também de conceito universal, e que consiste numa representação abstrata da substância primeira. O processo do
conhecimento se completa mediante a predicação, pela razão, no juízo, em
relação a uma substância primeira, da substância segunda, abstrata, que lhe é
correspondente. Quando digo, por exemplo, “isso é um cachorro”, estou
predicando a representação abstrata que repousa na minha razão, de um ente
concreto que está diante de mim, o animal de quatro patas que eu chamo de
“cachorro”.
Aristóteles
valoriza a experiência (ampeiría).
Para ele, todos os nossos conhecimentos provêm dos sentidos. Os escolásticos
sintetizaram esse princípio aristotélico da seguinte forma: “nihil est in intellectu quod prius non
fuerit in sensu” (“Não há nada no
entendimento que antes não tenha passado pelos sentidos”). Para Aristóteles,
há cinco tipos de conhecimento, todos eles interligados, começando pelos
sentidos e subindo até intelecção. Temos, em primeiro lugar, o conhecimento
sensorial (aísthesis) em segundo
lugar, o conhecimento empírico propriamente dito (ampeiría) em terceiro lugar, vem o conhecimento técnico (téchne) em quarto lugar, temos o
conhecimento científico, pelas suas causas, das substâncias ocultas atrás dos
fenômenos (epistéme) e, em quinto
lugar, o conhecimento das totalidades à luz do ser (sofía).
A nossa razão atua
como ordenadora dos fenômenos dispersos, mediante a intuição das essências
substanciais das coisas que aparecem na experiência sensorial. Aristóteles
valoriza o conhecimento das coisas da natureza pelas suas causas, bem como a
classificação dos seres a partir da experiência, sendo que a Lógica fornece os
instrumentos conceituais necessários para essa ação ordenadora. Dentre os
conceitos que a Lógica oferece, sobressaem os de gênero e diferença específica.
É possível fixar conceitualmente as características essenciais de uma
determinada realidade, mediante a explicitação do gênero próximo ao qual ela pertence, adicionando a diferença específica, que é a responsável
pela sua identidade, no contexto do gênero. Assim, por exemplo, a essência
humana consistiria de duas notas: animal
(gênero próximo) e racional
(diferença específica). Utilizando esse mecanismo, Aristóteles realizou amplo
trabalho de classificação dos seres vivos, dando início à taxonomia.
No que tange ao
conceito de verdade, Aristóteles distingue dois tipos: verdades categóricas (aquelas referidas às substâncias que, no
Cosmo, têm regularidade nas suas ações, o que os Gregos, de modo geral,
denominavam de tropos) e verdades dialéticas (aquelas referidas
ao comportamento humano, não totalmente previsível porquanto ancorado na
liberdade de escolha, e que os pensadores gregos denominavam de anthrópos). Uma coisa é verdadeira
quando, no juízo afirmamos de uma substância primeira, o conceito universal (ou
substância segunda) que lhe corresponde. Assim, por exemplo, quando digo: “este
animal é um cachorro”, a minha afirmação é verdadeira se, efetivamente, a essência
do bicho que estou vendo é a de cachorro. Incorro em falsidade quando afirmo de
uma substância primeira a substância segunda (ou o conceito universal) que não
lhe corresponde (como quando digo de um cachorro que é gato).
4 – A Psicologia
ou Tratado da Alma complementa a
Teoria do Conhecimento de Aristóteles. O Estagirita
distingue três partes da Alma, que remetem a três estratos da Natureza: a Alma Vegetativa ou Alma das Plantas; a Alma Sensível
ou Alma dos Animais e, finalmente, a Razão, que somente se encontra no homem.
A Alma Vegetativa é responsável pela
subsistência; a Alma Animal é
responsável pela sensação e o movimento local, enquanto que a Razão (nous) é responsável pela atividade intelectual. A Alma é o princípio formal de todo corpo.
A respeito frisa Aristóteles: “Assim, também, a alma é a entelequia primeira de um corpo natural que possui a vida em
potência; tal é o caso do corpo organizado”.
Ao Espírito corresponde um estatuto
particular: podemos subdividi-lo em Espírito
Sensitivo (receptivo) e em Espírito Agente
(ativo), um desempenhando a função de matéria (potencialidade) e o outro a
função de forma (atualidade). O Espírito
Sensitivo (que está em relação com as percepções da segunda parte da alma)
recebe os objetos do pensamento segundo a forma, enquanto que o Espírito Agente representa o espírito
todo-poderoso para a atividade da alma espiritual.
Ao contrário das
outras partes da alma, o Espírito Agente
não está ligado ao corpo e é, assim, imortal. Mas, como o pensamento não pode nascer
senão da relação com a sensação, o Espírito,
após a morte, não é mais um Espírito
Individual (diferentemente do que Platão defende com a sua teoria da alma).
5 – A Teoria do Conhecimento em Aristóteles ancora na
Metafísica. A ordem do conhecimento segue a ordem do ser. Assim
Aristóteles se mantém fiel à herança platônica. Aristóteles, no entanto, pensa
o Ser não como alicerçado num Sumo Bem distante do mundo, mas como o fundamento
de tudo quanto existe. O Cosmo e o Homem estão presentes no Ser. Não há,
portanto, um mundo separado de Idéias Eternas.
O Ser é partilhado
pelos entes, mas eles não o esgotam. Aristóteles partiu, na sua Metafísica,
para fundamentar as relações entre o Ser e os entes, mediante a sua doutrina da
potência e do ato. Todos os seres do Cosmo, o homem inclusive, partilham
limitadamente do Ser, pois são compostos de potência
e ato.
6 – A dinâmica da Natureza, a partir dos conceitos de
Matéria e Forma. Nos livros da Física, Aristóteles mostra que o
Cosmo foi formado a partir de uma matéria primeira (próte hyle) que constituiu os quatro elementos (terra, água, fogo e
ar) de que estão compostos todos os corpos. Potência e Ato, nesta dimensão que
constitui a Natureza (fysis)
relacionam-se como matéria (hyle) e
forma (morfé). Estes conceitos
integram a denominada Teoria hilemórfica.
Aristóteles
desenvolveu a sua teoria da causalidade,
para explicar as relações entre os corpos no seio da Natureza. Quatro são as
causas: material, formal, eficiente e final. Elas pressupõem a substância, onde
se dá a sua dinâmica. Aristóteles reconhecia dois modos de ser ou categorias: ser em si (substância ou ousía)
e ser em outro (acidente). O ser em outro se pode dar de nove formas
diferentes (que os escolásticos passaram a denominar com as seguintes expressões
latinas: quantidade, qualidade, relação, ação,
paixão, quando, onde, situação e hábito).
Na sua teoria da causalidade, Aristóteles dá destaque à causa eficiente e formula o princípio segundo o qual “tudo que se
movimenta é movido por outro”, que o leva a postular a existência do “motor
imóvel”, causa primeira do movimento do Cosmo.
No seu tratado da Física,
no livro II, o Estagirita oferece quatro definições acerca da Natureza: ela é
“Princípio e causa de movimento e de repouso, para a coisa em que ela reside
imediatamente e não por acidente”. A Natureza é, também, “A matéria que serve
de sujeito imediato a cada uma das coisas que possuem em si um princípio de
mudança e movimento”. O Filósofo ainda traz esta definição de Natureza: “Nas
coisas que possuem em si um princípio de movimento, (ela) é a forma e o tipo separáveis só logicamente”. Sintetizando, a Natureza é, para
Aristóteles, princípio de movimento e
de crescimento. Um detalhe
etimológico deve ser salientado: fysis
(natureza) vem do verbo fyo
(crescer). A quarta definição de Natureza é, segundo Aristóteles, a seguinte:
“Sendo a natureza dupla, matéria de um lado e forma, de outro, e sendo ela um
fim, e estando as demais (coisas) ordenadas a esse fim, ela será uma causa, a
causa final”. A Física de Aristóteles é, conseqüentemente, uma física
finalista, na qual é essencial a experiência, a fim de abarcar o conjunto de
aspectos que rodeiam a Natureza.
Outro conceito que,
na Física,
é importante para Aristóteles, é o de movimento.
Ele o define como surgimento, mudança,
progresso ou degradação. O
movimento, quando se trata de um ser vivo, é denominado de metabolé (daí provém o termo metabolismo).
Mas quando é entendido como mudança
de lugar, é denominado de kínesis (daí
provém o termo cinema). Existem, para
Aristóteles, dois tipos de movimento: substancial,
que recai sobre a substância e consiste na geração
ou na corrupção. O segundo tipo de
movimento é o acidental, que não
modifica essencialmente a substância, atingindo apenas algumas qualidades acidentais,
tais como: crescimento e diminuição, alteração e translação.
7 - A ética aristotélica tem por objetivo o domínio da
ação humana, em tanto que alicerçada numa decisão e a política é o terreno da
sua aplicação social. Distingue-se a ética da filosofia teorética, que se dirige ao imutável e eterno.
Por natureza,
segundo Aristóteles, todo ser tende a um bem que lhe é próprio e no qual
encontrará a sua realização. O bem humano é a atividade da alma conforme à
razão. Nessa atividade, o homem descobre a felicidade (eudemonía), que é independente das circunstâncias exteriores, como
objetivo final das suas aspirações. Como frisa Aristóteles na sua Ética
a Nicômaco, “O bem do homem consiste numa atividade da alma conforme à
virtude”.
Aristóteles
distingue entre virtudes dianoéticas
(que se manifestam no exercício da razão) e virtudes
éticas (que são transmitidas pela ordem estabelecida na sociedade e na Polis)
sendo que elas recebem a sua validade da tradição e do consentimento universal.
A virtude dianoética fundamental é a prudência (frónesis) que leva o homem a reconhecer os meios e os caminhos
justos que conduzem ao bem. À luz dessa virtude o homem desenvolve a atitude ética, que se formata mediante a
prática das virtudes (através do exercício,
o hábito e a aprendizagem).
No que tange ao
conteúdo, a virtude ética é definida como o justo
meio (mesotés) entre dois
extremos contrários. Assim, por exemplo:
a coragem ocupa o lugar intermediário
entre a covardia e a temeridade. A moderação é um intermédio entre a apatia e a excessiva vontade
e a generosidade é o equilíbrio entre
a avarícia e a prodigalidade.
A justiça (dikaiosýne) para Aristóteles é a virtude mais importante para a
vida em comum. Em tanto que distributiva,
ela cuida de distribuir os bens justamente; em tanto que corretiva, ela compensa os danos ou os prejuízos sofridos por
alguém. Uma virtude essencial é, também, a amizade.
Graças a ela, o homem experimenta a passagem dos interesses individuais para aqueles
que constituem a comunidade.
A ética
aristotélica, contrariamente à platônica, é uma moral concreta da liberdade e
da diferença entre os homens da cidade. Ela define um espaço de discussão, que
deve permitir chegar a um bem soberano, que não é transcendente (como em
Platão), nem imposto desde cima por algum sábio. O bem soberano aristotélico
nasce exclusivamente do contato entre os homens livres.
No que tange à
ordem política, diferentemente de Platão (que privilegiava o modelo
aristocrático), ela é variada, para Aristóteles, podendo ser de três tipos: realeza (cuja degeneração é a tirania), aristocracia (cuja corrupção é a
oligarquia) e politéia ou governo do
povo, (cuja degeneração é constituída pela democracia). Contrariamente a
Platão, que no relativo ao conhecimento racional da realidade política dava
prelação à Idéia sobre os conhecimentos empíricos, Aristóteles privilegia estes
últimos. Nesse terreno, o filósofo de Estagira realizou estudos comparados,
tendo chegado a identificar 158 formas de organização ou de constituição
política. Desses estudos somente nos restou o escrito intitulado Constituição
de Atenas.
Platão concebia uma
visão ideal da política, ao passo que
Aristóteles concebe uma idéia possível.
Ele é partidário de um realismo político. Na obra Política, frisava:
“Deve-se, efetivamente, examinar não somente o melhor regime político, mas
também aquele que é simplesmente possível”. Contrariamente a Platão, para quem
os homens ingressavam no Estado em decorrência das suas fraquezas, Aristóteles
considera que os homens procuram a ordem política, movidos pela sua natureza
sociável. A respeito, escreve: “O homem é por natureza um animal político”.
A linguagem é um
signo de que o homem não está destinado unicamente à simples sobrevivência, mas
a viver numa comunidade que deve chegar
a acordos acerca do útil, do bom e do justo. Como Platão,
Aristóteles considera que a tarefa do Estado consiste em possibilitar a
realização ética dos cidadãos. No entanto, enquanto o mestre de Aristóteles
considerava que a questão ética consistia em partir para um processo de
catarse, a fim de o homem voltar à contemplação pura das Idéias no reino do
Sumo Bem, para o Estagirita essa realização consiste em algo muito mais singelo
e terreno: o amor à vida feliz e boa. É somente no seio do Estado que se pode
desenvolver perfeitamente a virtude do indivíduo.
O Estado, para
Aristóteles, se forma a partir de um conjunto de comunidades que vão se
alargando. A propósito, frisa: “Na origem, existe a comunidade de duas pessoas
(homem e mulher, pai e filho, amo e servo). Estes, juntos, constituem a família, a partir da qual, a seguir,
constitui-se a aldeia e por fim a cidade (pólis) que é o reagrupamento de várias aldeias”. É somente a partir
da cidade que é garantida a autarquia
(ou seja, o fato de se garantir, a si próprio, a independência e a autossuficiência).
O princípio formal
da pólis, para Aristóteles, é a constituição. A respeito, frisa: “A
cidade é uma espécie de comunidade e uma participação comum dos cidadãos no
governo”. O filósofo divide as formas de constituição
em três “tipos justos” (realeza, aristocracia, politéia). O critério de classificação é o número dos que
participam do poder político: um, alguns,
todos.
É boa a forma de
governo que serve ao bem-estar geral; é ruim aquela que somente persegue os
interesses dos que mandam. Aristóteles não prefere de entrada uma das três
formas de organização da cidade
mencionadas. Considera, contudo, que a mais realizável e a mais estável é a politéia ou democracia moderada. É uma
forma que mistura as vantagens das outras constituições e que realiza o
princípio formulado na Ética, da virtude como justo meio
entre os extremos. A propósito, escreve: “A melhor comunidade política é aquela
que constitui a classe média[3]
(...). O seu predomínio restabelece o equilíbrio da balança e impede a aparição
dos excessos contrários”. Da análise histórica Aristóteles conclui que a melhor
forma política, em cada caso, é aquela que melhor convém ao país e às
necessidades dos cidadãos.
Em relação à
questão da ordem interior do Estado, Aristóteles considera que é necessário
preservar a família e a propriedade privada. Segundo
Aristóteles, a família é ainda mais elementar que a aldeia e esta é mais primária
que o Estado ou a pólis. A família
deve ser privilegiada em tanto que base da ordem natural da sociedade[4],
mesmo se o Estado joga um papel essencial na educação da juventude. Em relação
à propriedade privada, Aristóteles considera que “a propriedade deve ser
privada, mas o seu uso deve ser comum”.[5]
Nestes aspectos, certamente, Aristóteles se distancia dos ensinamentos do seu
mestre Platão.
No que tange à
estrutura interna da sociedade, Aristóteles reconhece, além da escravatura, a
desigualdade natural entre homens e mulheres. Tanto uma quanto outra constituem
“condições naturais” da vida humana. Mas, entre os homens livres, deve reinar a
igualdade.
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(Tradução de Silvestre Pinheiro Ferreira; apresentação de Pinharanda Gomes).
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d´Athènes. (Edição organizada por Georges Mathieu e Bernard
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à Eudemo. (Tradução francesa de Émile Davielle). Paris: Agora/Pocket,
1999.
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(Tradução, introdução e notas de Mário da Gama Kury). Brasília: Editora da Universidade de Brasília
/ Instituto Nacional do Livro, 1985.
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(Tradução de Carlos Nougué. Introdução de Olavo de Carvalho). Rio de Janeiro:
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Joaquim José. A amizade em Aristóteles. Londrina: UEL, 1999.
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RUSS, Jacqueline. Nouvel
abrégé de Philosophie. 4ª edição. Paris: Armad Colin, 2005.
[1] Boécio era de família nobre e ocupou altos cargos na corte do rei ostrogodo
Teodorico (454-526). Os estudiosos consideram Boécio como o último romano e o
primeiro escolástico.
[2] Filósofo, médico e Papa com o nome de João XXI, nascido em Lisboa, foi
conhecido na Idade Média com o nome de Pedro
Hispano Portucalense.
[3] É interessante destacar que este conceito de classe média inspirou aqueles autores que, na modernidade, tentavam
encontrar um caminho justo entre os extremos da aristocracia (que prevaleceu no
Ancien Regime) e do populismo manipulado pelo déspota (que se tornou o caminho
do bonapartismo, após a Revolução Francesa). Para os doutrinários franceses,
François Guizot (1787-1874) à testa, o modelo social que contaria com plena
estabilidade na França seria o presidido pela classe média, sendo as eleições mecanismos para depurar a média da opinião. Tal conceito entrou a
formar parte do jargão político brasileiro, no discurso dos liberais gaúchos,
sendo Joaquim Francisco de Assis Brasil (1857-1938) um dos que adotaram tal
terminologia.
[4] Este conceito de valorização da família como célula mater da sociedade, entrou a formar parte do arcabouço
doutrinário dos pensadores escolásticos e foi adotado pela denominada Doutrina
Social da Igreja Católica, que teve o Papa Leão XIII (1810-1903) como um dos
seus principais formuladores.
[5] Este é um conceito básico da Doutrina Social da Igreja Católica e
aparece em pensadores católicos de orientação liberal como Alexis de
Tocqueville (1805-1859), que o utiliza com a denominação de “interesse bem
compreendido”.
Questões para
serem respondidas
1 – A lógica formal aristotélica é importante na
elaboração de raciocínios, porque:
o
A – Permite-nos distinguir os raciocínios válidos dos inválidos ou
falaciosos.
o
B – Permite aos políticos enganar e vencer os seus oponentes.
o
C – Revela a índole falaciosa da religião.
2 – Na teoria do conhecimento, Aristóteles partiu para
elaborar um ponto de vista transcendente ou realista, cuja principal
característica consiste:
o
A – Em pressupor que nós só conhecemos a aparência dos fenômenos
apreendidos na experiência, sem que consigamos chegar à sua essência
substancial.
o
B – Em pressupor que nós podemos chegar ao conhecimento da essência
substancial das coisas, partindo do conhecimento das aparências.
o
C – Em pressupor que nós não conseguiremos conhecer adequadamente nem as
aparências das coisas, nem a sua essência substancial, ficando mergulhados na
dúvida.
3 – Na política, Aristóteles considerava que os
governantes deveriam implantar:
o
A – Um regime centrado na virtude e obediente às ordens do Rei Filósofo.
o
B – Uma Cidade-Estado que deveria ser cópia da democracia ateniense.
o
C – Um governo que correspondesse às tradições vigentes entre os
habitantes que seriam governados.