PLOTINO (206-266) E O
NEOPLATONISMO
PLOTINO (206-266) sistematizador da corrente do Neo-Platonismo |
O Neoplatonismo constitui o último grande sistema da
Antigüidade. Com ele, os filósofos remontam, numa perspectiva especialmente
cosmológica, a Platão, juntando as teses deste pensador às de Aristóteles
(384-324 a.C) e os Estóicos. As figuras mais representativas do Neoplatonismo
foram:
- Ammônio Saccas (175-242), mestre de Plotino e
fundador da Escola de Alexandria.
- Plotino, o verdadeiro fundador do Neoplatonismo.
- Proclo (410-185) que deu ao Neoplatonismo a sua
maior coerência doutrinária e sistemática.
Plotino seguiu as lições de Ammônio Saccas em
Alexandria. Instalou-se, depois, em Roma e abriu ali uma escola que teve grande
sucesso, especialmente junto ao imperador Galieno (253-268), que tinha
projetado construir uma cidade chamada “Platonôpolis”.
A filosofia de Plotino está sintetizada nas Enéadas,
que foram organizadas, em seis volumes, pelo seu discípulo Porfírio (232-304).
Essa obra descreve a ascensão em direção ao Um e a descida a partir dele. Este
UM é descrito por Plotino como o Bem e constitui a unidade absoluta ou a
plenitude. É dele que provém todo ser, bem como toda beleza. Ser nenhum existe
fora dessa relação com o Um. Plotino utiliza a imagem do sol. Escreve a
respeito: “A luz está inseparavelmente ligada ao sol. Não é possível separá-la
dele. De maneira análoga, o Ser não pode se separar de sua fonte, o Um”.
O pensamento de Plotino pode ser sintetizado nos
seguintes seis pontos:
1 - Posto que o
Um é unidade absoluta, um acesso mais direto a ele, conceitualmente mais
diferenciado, é impossível. A respeito, Plotino escreve: “Não dizemos: é isso que é o Um, a fim de evitarmos enunciar o Um como atributo
de um sujeito diferente do Um. Nome nenhum lhe convém. No entanto, posto que é
preciso nomeá-lo, é conveniente chamá-lo de o Um, mas não no sentido de que
seja uma coisa portadora do atributo do Um. O Um é mais conhecido pelo seu
efeito, que é o Ser”.
2 - O Um
transborda por causa de sua superabundância, processo que Plotino descreve como
“brilhar em forma de raios” ou “emanação”. O
nível supremo pertencente ao Ser metamorfoseia-se num estado inferior. Nesse
processo, este estado perde, ao se expandir, unidade e plenitude, até que o Ser
forma, com a Matéria, o mundo dos corpos.
3 - Desse
processo nasce o Espírito (Pneuma). Ele representa a esfera das idéias, ou seja, dos
arquétipos eternos de todas as coisas. É por isso que ele é o ser existente
mais elevado. Esse mundo inteligível converge em direção ao Um, mas em si ele
se diferencia, pois, como frisa Plotino, “O pensamento do espírito necessita da
separação do pensante e do pensado e da diferenciação dos objetos entre eles”.
A maturidade do Espírito guarda o fruto da Alma. A propósito, frisa Plotino:
“Como a palavra é o reflexo do pensamento, assim a Alma é o reflexo do
Espírito”.
4 - Em tanto que
efeito do Espírito, a mais alta atividade da Alma consiste na visão do mesmo
Espírito. A
Alma vincula as esferas do espiritual às esferas do temporal e material. Em
relação a este ponto, escreve Plotino: “Em tanto que Alma do Mundo, ela
penetra, forma e anima o Cosmo, conferindo ao Mundo a sua harmonia”. Essa Alma
do Mundo possui ou encerra em si as Almas Individuais, que se unem à Matéria
para formar, assim, os objetos particulares do Mundo material.
5 - Plotino
descreve a Matéria como o Nada. Ela é, em si, sem forma e vazia. Ela se encontra na máxima
distância da luz do Um, de forma que Plotino fala da “obscuridade da Matéria”.
Escreve a respeito: “A união da Matéria e da Alma turva a visão desta última
pelo Espírito e pelo Um, do qual ela provém”. A ascensão em direção ao Um é
vista, por Plotino, como um processo de purificação. O impulso desse movimento
é dado pelo Amor (Eros) à Beleza e ao Um originais. A ascensão conduz à
contemplação. A respeito, escreve Plotino: “A arte, por exemplo, ao passar pela
percepção da beleza sensível, conduz até a apreensão da Beleza da forma pura,
contida nela mesma”.
6 - A Alma
supera o mundo das sombras dos corpos e retorna ao Espírito. A libertação mais elevada é
a êxtase ou submissão imediata à contemplação do Um. Mas o homem conta, também,
com duas outras possibilidades libertadoras, de caráter mediato: a contemplação
artística, que conduz ao Espírito e, de outro lado, o conhecimento, que conduz,
também, ao Espírito.
FÍLON DE ALEXANDRIA (20
a.C-50 d.C)
FÍLON DE ALEXANDRIA (20 a.C.-50), autor de original projeto filosófico-teológico. |
Aspectos que se destacam na obra de Fílon: ele adotou,
em primeiro lugar, um projeto filosófico-teológico; em segundo lugar, formulou
uma teoria acerca dos três planos de que se compõe a realidade e, em terceiro
lugar, partiu para identificar o caminho pelo qual podemos chegar ao Absoluto,
que consiste no conhecimento de Deus pelas suas obras.
1 – Projeto
filosófico-teológico. Fílon tentou traduzir o
conjunto doutrinário contido no Antigo Testamento, considerado como um todo
coerente e articulado, em termos das grandes correntes da sabedoria helênica e
helenística, procurando convergências com a Revelação judaico-cristã. Baseado
na versão grega do texto bíblico denominada Dos
Setenta Septuaginta (LXX), Fílon interpretou o texto tanto alegórica
como literalmente. Ele considerava a tradução grega da Bíblia tão inspirada por
Deus como o original hebraico, e
defendendo que as versões hebraica e grega deveriam ser tratadas “com temor e
reverência, como irmãs, ou antes como uma e a mesma coisa, tanto no assunto
como nas palavras” (De Vita
Mosis 2.40)[1].
Para efetivar a sua nova interpretação do texto
bíblico, Fílon recorreu, de forma predominante, às filosofias platônica e
aristotélica, bem como à estóica, selecionando as soluções por elas propostas e
partindo para um ousado esforço hermenêutico dos textos bíblicos. O Antigo
Testamento, em que geralmente se alicerçou, foi interpretado seguindo três
graus de alegoria: a - sentido
cosmológico (referente à natureza), b
- sentido psíquico (relativo ao espírito humano) e c - sentido mítico (apontando aspectos ocultos ou misteriosos da
vida divina).
2 – Três planos
da realidade.
O primeiro plano, para Fílon, estava constituído por Deus e pelo Logos. O
pensador definia Deus como o Ser,
interpretando metafisicamente as palavras de Yahvé a Moisés no Êxodo:
“Eu sou o que sou” e “Eu sou Aquele que é”. Deus é a realidade suprema,
transcendente, não redutível ao mundo. O Logos é a primeira obra de Deus e Lhe
está subordinado; é anterior ao mundo dos arquétipos, criados previamente como
modelos do mundo material, também criação de Deus. O Logos é o Demiurgo, imagem
e sombra de Deus. O segundo plano da realidade estava constituído pelos
mediadores criados, situados abaixo do Logos, os Anjos. Eles são colaboradores
por ordem de Deus na construção do mundo dos arquétipos, e superiores a estes.
“Anjos” é o nome dado, também, aos espíritos que podem se unir a um corpo,
tornando-se, assim, almas dos homens. O Homem e o Mundo constituem o terceiro
plano da realidade, o mais inferior por estar vinculado à matéria.
3 – Conhecimento
de Deus pelas suas obras. Inatingível na sua Essência, Deus pode ser conhecido, na sua
Existência, graças às suas obras, que são de dois tipos: a – a existência de perfeições finitas no mundo exterior (que
pressupõem, à maneira platônica, a existência de uma Perfeição Infinita); b – a ação divina no interior do homem,
pela profecia.
O CETICISMO
PIRRO DE ELIS (365-275 AC) ACOMPANHOU ALEXANDRE O GRANDE (356-323 AC) NA EXPEDIÇÃO À ÍNDIA. |
Sexto Empírico (200-250 d.C),
sistematizador da Corrente Cética
|
Esta corrente de pensamento foi formulada,
inicialmente, por Pirro de Elis
(365-275 a.C). Ulteriormente, a doutrina recebeu formatação sistemática de Sexto Empírico (200-250 d.C).
Destaquemos alguns aspectos biográficos acerca destes
pensadores. Pirro nasceu em Elis (cidade situada no noroeste do Peloponeso) e
acompanhou Alexandre o Grande (356-323 a.C) na sua expedição à Índia. Ao
regressar, foi nomeado pelos seus concidadãos “Grande Sacerdote de Elis”. O
único escrito que restou do pensador foi uma ode dedicada a Alexandre. Pirro
pertencia a uma família humilde e as inúmeras viagens de juventude, certamente,
contribuíram para que aperfeiçoara os seus conhecimentos. Discípulo de Pirro,
em Elis, foi Timon Silógrafo (320-230 a.C), poeta satírico que se instalou em
Atenas, onde divulgou os ensinamentos do mestre. Ulteriormente, Enesidemo
(80-10 a.C), seguidor de Pirro, fundou uma escola em Alexandria, na qual
ensinou as doutrinas do filósofo, compiladas na obra que levou o título de Discursos
Pirrónicos, que deram ensejo à corrente denominada, genericamente, de
“pirronismo”. Dentre os seus ensinamentos, Pirro formulou os dez tópicos ou
motivos de dúvida do ceticismo antigo.
Não
se conhece o lugar de nascimento de Sexto o “Empírico”, assim chamado pela sua
prática da medicina. Viveu em Atenas, Alexandria e Roma. Os seus escritos foram
muito influenciados pelos ensinamentos de Pirro e Enesidemo e estavam dirigidos
contra a dogmática, ou doutrina filosófica que pretendia conhecer a verdade
absoluta, tanto no relativo à moral quanto no que diz relação às ciências. Duas
obras se conservaram da lavra de Sexto Empírico: os Esboços Pirrónicos e Contra
os Matemáticos. A respeito da doutrina cética, Sexto Empírico escrevia,
na primeira das obras mencionadas: “O ceticismo é a faculdade de opor, de todas
as formas possíveis, entre si, as aparências (ou fenômenos) e os conceitos. A partir daí, nós chegaremos,
em virtude da força igual das coisas e das razões contrapostas, à suspensão do
juízo e, posteriormente, à Paz da Alma (ataraxía)”.
Nos seguintes cinco itens podemos sintetizar a
doutrina cética:
1 - O ponto de
partida do ceticismo de Pirro é a relação entre a suspensão do juízo (epoché) e a paz da alma (ataraxía). Toda inquietação provém da
obrigação de conhecer e de conferir valor às coisas. A crença dogmática nos
bens ou nos males naturais produz, no homem, confusão e angústia. A respeito,
frisava Pirro: “Quando os céticos suspendem o seu julgamento e atingem a
indiferença, a paz da alma se segue como a sombra segue o corpo”.
2 - O ceticismo
de Pirro fundamenta a suspensão do juízo sobre a natureza das coisas, no
“conflito das coisas equivalentes (isosthenie)”, que é caracterizado assim
por este pensador: “Para cada enunciado podemos pensar um enunciado oposto
equivalente”. Os céticos buscam as possibilidades de uma oposição suscetível de
fazer advir a suspensão do juízo (epoché). Para que aconteça esse
estado mental, um fenômeno ou um pensamento é comparado com um fenômeno ou um
pensamento contrários. Com a finalidade de pôr em prática esse tipo de
oposição, Sexto Empírico apresentou três tropos ou três formas lógicas de
relatividade:
É relativo:
- Aquele que
julga, pois os seres vivos, os homens, os órgãos sensíveis e as
circunstâncias são diferentes, no momento em que se produz a percepção.
- Aquilo que é
julgado, pois os objetos parecem diferentes, de acordo com a sua
quantidade. Mesmo os costumes e os usos da vida dos povos são diversos.
- Aquele que
julga e aquilo que é julgado ao mesmo tempo, pois, dependendo da sua
posição, o observador vê coisas diferentes. Um dos dois (observador e
observado) tem algo de confuso ou impuro. A freqüência do fenômeno determina,
também, a sua importância.
3 - O ceticismo
exprime a dúvida fundando-a,
metodicamente, em palavras de
ordem (= fónai), tais como: “não
totalmente”, “pode ser”, “tudo é indefinido”, etc. A validade destas palavras é não-dogmática, ou seja, aberta à dúvida.
A Escola Pírrica atinha-se, estritamente, ao fenômeno, que o cético, em geral,
não podia rejeitar ou julgar. De acordo às hipóteses céticas, o homem deveria
não somente se abster de formular juízos definitivos, como também de agir. Ora,
sendo isso impossível, o cético deveria se nortear de acordo à experiência da
vida cotidiana. Desse contexto formam parte os costumes aceitos, bem como as técnicas
utilizadas pelas comunidades humanas. A respeito, Sexto Empírico escrevia:
“Submetendo-nos (de forma não dogmática) a esses parâmetros, podemos passar do
julgamento à ação”.
4 – Sexto
Empírico sustentava a hipótese de que a suspensão
do juízo ou epoché não poderia
ser radical, ao ponto de suspender todos os conhecimentos. Assim, defendia uma
ética do senso comum. Embora, como pirroniano, aceitasse a indiferença (adiaphora)
em face das soluções morais, reivindicava, também, a importância da experiência
empírica. Por esse motivo, considerava que a vida prática dever-se-ia nortear
por quatro guias: a experiência da vida, as indicações que recebemos da
natureza através dos sentidos, as necessidades do corpo e as regras das artes.
O filósofo criticava o silogismo, que era considerado, por ele, como um círculo
vicioso e contraditava, também, a noção de signo, tão cara aos estóicos. Criticava,
outrossim, a teologia estóica, destacando as contradições que abrigava a noção
de divindade, pois se tudo quanto existe é corpóreo (como acreditavam os
estóicos), Deus não poderia deixar de ser material e, portanto limitado
(deixando, portanto de ser Deus).
5 - Com
Arcésilas (315-240 a.C) a Nova Academia de Atenas tomou um rumo renovado,
influenciada pelo pirronismo. A finalidade da suspensão do juízo (epoché)
seria, antes de mais nada, o conhecimento certo. Os céticos da Nova Academia
disputaram com os estóicos a propósito da existência de representações
catalépticas, que nos obrigam a aderir a elas. Não existem critérios de
verdade, mas unicamente de probabilidade.
As representações somente podem ser críveis,
ou também sem impedimento, ou seja,
que não estejam em contradição com alguma representação. A certeza mais
provável aparece quando a representação é totalmente examinada.
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